A luz do Sol descia, oblíqua, por entre as frestas dos galhos das árvores e dos telhados das antigas mansardas.
Algumas delas mal assombradas.
Naquele momento, sob a luz coada através da poeira, lançando sombras sobre os recônditos dos quintais antigos, falávamos dos mortos.
Dos mortos de todos os tempos, dos nossos, dos outros, dos gatos do Cemitério.
Há algo estranho nesse ritual macabro que não deixa resquícios além dos pequenos cadáveres.
Um vento súbito, frio e sujo agitou as folhas secas na calçada, na rua, para além de todas as calçadas e ruas, para além dos limites de todas as cidades e do Tempo.
O amigo comentou o adiantado da hora, a necessidade de comprar o pão, de apanhar a companheira no serviço, aquelas coisas triviais e consistentes com a realidade vivida, aquela realidade que nos acompanha do berço ou túmulo.
Falávamos do mortos.
A última réstia de luz se apagou de sobre o telhado da capela.
Na sequência, abotoar a blusa de frio, despedir-se, dar partida na máquina e mergulhar na tarde fria de todas as tardes.
Até um outro dia qualquer. Falávamos dos mortos.
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